A demência é uma condição que representa um grande desafio para a saúde pública global. Estima-se que o número de pessoas afetadas aumente de 57,4 milhões em 2019 para 152,8 milhões em 2050, tornando-se uma das principais causas de incapacidade até 2025. Diante desse cenário, cresce a necessidade de estratégias eficazes para reduzir o impacto da doença, e a prevenção surge como uma das abordagens mais promissoras.
Em 2024, a Comissão Lancet sobre prevenção, intervenção e cuidado da demência atualizou a lista de fatores de risco modificáveis, ampliando de 12 para 14 itens. Foram acrescentados o colesterol LDL alto e a perda visual não tratada, além de atualizações nos cálculos de risco relativo e prevalência. Globalmente, esses fatores estão associados a 45% dos casos de demência, mas os números variam de acordo com a realidade de cada país.
Fatores de risco no contexto brasileiro
O estudo analisou, pela primeira vez, o potencial de prevenção da demência no Brasil com base nos 14 fatores de risco modificáveis. Utilizando dados do Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI-Brasil), a pesquisa estimou que quase 60% dos casos de demência no país poderiam ser prevenidos ao abordar esses fatores (Suemoto et al., 2024) .
Entre eles, destacam-se:
- Baixa escolaridade na infância, com a maior fração atribuível (9,5%);
- Perda visual não tratada na velhice (9,2%);
- Depressão na meia-idade (6,3%).
A maioria dos casos foi atribuída a fatores presentes na meia-idade.
Diferenças por sexo
O estudo também identificou diferenças entre homens e mulheres. O potencial de prevenção foi maior em mulheres (61,1%) do que em homens (58,2%). Enquanto a baixa escolaridade e a perda visual foram relevantes em ambos os sexos, a depressão teve maior impacto nas mulheres, e a inatividade física foi mais expressiva entre os homens. Além disso, o tabagismo e o consumo excessivo de álcool apareceram com maior peso entre os homens, enquanto colesterol alto e depressão tiveram maior influência entre as mulheres.
Desigualdades sociais e acesso à saúde
Os achados reforçam a importância de considerar desigualdades sociais e regionais. A prevalência de fatores como baixa escolaridade e perda visual reflete disparidades históricas no acesso à educação e aos cuidados de saúde, especialmente em populações mais vulneráveis. Embora o Brasil tenha sistema de saúde universal, barreiras de acesso, principalmente em áreas carentes, ampliam o risco de desenvolvimento da demência.
Implicações para a saúde pública
Os resultados apontam que investimentos em educação na infância, cuidados oftalmológicos acessíveis e expansão dos serviços de saúde mental podem reduzir significativamente a carga da demência no Brasil. Além disso, estratégias de prevenção voltadas a estilos de vida, como promoção da atividade física, combate ao tabagismo e ao consumo excessivo de álcool, também são fundamentais.
Por fim, nota-se que este estudo destaca que quase 60% dos casos de demência no Brasil podem ser potencialmente prevenidos ao se abordar fatores de risco modificáveis. Mais do que números, esses achados apontam caminhos concretos para políticas públicas voltadas à promoção da saúde ao longo de toda a vida. Ao adotar medidas de prevenção adaptadas à realidade brasileira, é possível reduzir de forma significativa o impacto da demência, trazendo benefícios tanto individuais quanto sociais.
Referências bibliográficas:
SUEMOT , Claudia K. et al. The potential for dementia prevention in Brazil: a population attributable fraction calculation for 14 modifiable risk factors. THE LANCET, [s. l.], 1 set. 2025.