A Avaliação Neuropsicológica é um processo complexo, que visa traçar o perfil do avaliado considerando suas potencialidades e/ou dificuldades cognitivas, emocionais e sociais. Nesse sentido, para evitar vieses de interpretação e por considerar que os indivíduos são biopsicossociais e estão sempre inseridos em diversos contextos (familiar, acadêmico, profissional, social, etc.), é fundamental coletar heterorrelatos ao longo da avaliação.
Os heterorrelatos são informações fornecidas por terceiros que possuem um bom nível de convívio com o paciente ou o obtiveram ao longo de sua vida e contribuem não só para a compreensão do funcionamento e histórico de funcionamento cognitivo, social e emocional da pessoa mas, consequentemente, para orientar as próximas etapas da avaliação e intervenção.
Na avaliação de crianças e adolescentes, o heterorrelato é, inclusive, a principal fonte de informação acerca da história clínica do paciente, já que a primeira entrevista é conduzida com os responsáveis pelo paciente e geralmente parte deles a demanda pelo serviço. Além disso, existem dificuldades de autopercepção próprias da faixa etária que exigem uma consulta a terceiros, como a escola, por exemplo, em que a criança e/ou adolescente passa a maior parte de seu tempo.
Contudo, quando se trata da avaliação de adultos, a depender do nível de funcionalidade do paciente, geralmente é ele quem busca o serviço e é com ele a entrevista de anamnese. Isso é valioso no sentido que é o próprio paciente que irá abordar suas características e experiências. Por outro lado, assim como as crianças e adolescentes possuem limitações na sua autopercepção, o adulto tem maiores dificuldades de recordar fatos de sua infância e adolescência, fundamentais quando se avalia uma hipótese de transtorno do neurodesenvolvimento.
Portanto, além de consultar pessoas do convívio próximo daquela pessoa, como um cônjuge (se houver), amigo ou colega de trabalho, é crucial consultar um familiar ou alguém que conhece o paciente há mais tempo. Assim, será possível não apenas compreender como o indivíduo se comporta em diferentes contextos ocupacionais e sociais, mas como esse comportamento evoluiu ao longo de sua história.
Vale lembrar que a coleta desses dados só pode ser realizada com o consentimento do paciente e, em casos de adultos emergentes ou com baixa funcionalidade, deve ocorrer no início do processo. Para outros pacientes, é recomendável que a coleta ocorra mais ao final para evitar vieses. Pelo menos um dos heterorrelatos deve ser colhido de forma síncrona, priorizando informantes que possam fornecer informações complementares.
A análise dos heterorrelatos deve ser cuidadosa, focada em padrões e discrepâncias, e os dados devem ser integrados com outras fontes de avaliação. Considerações éticas, como confidencialidade e consentimento, são essenciais durante todo o processo.
Escrito por: Mariana Atheniense
Referência: Júlio-Costa, A. (2024). Método Neuropsicoterapia: Guia de Orientações para Coleta de Heterorrelatos de Pacientes Adultos (1ª ed.).